Ciclo de Exposições na Ante-Sala e Salão da BASE
Exposição Solve et Coagula de Frederico Pratas.

Texto de Miguel Meruje

A mais recente apresentação de pinturas por Frederico Pratas é reunida sobre o título Solve et Coagula e, na expressão conjunta do corpo coeso que os quadros compõem, há um véu de mistério que, ora surge defronte ao gesto de pintar, ora serve para encobrir as camadas que contém as influências do artista.

Naquilo que de mais se destaca numa primeira impressão estão motivos carnais, no sentido mais visceral, de interioridade mas também de violento no que de profundo existe. Se por um lado isto é o que de mais permanente há, com a mortalidade como finitude necessária à condição humana, tudo pertence às partições do efémero. E aí se distingue o lado fotográfico destas obras, um terreno que se move lentamente mas que é campo de mudanças vagarosas mas perenes, existindo num território fora do cosmos onde se suprimem muitas das minudências que dão cor à vida, mas onde subsistem estas imagens da permanência do momentâneo, o registo “eterno” do que imediatamente desapareceu.

A cultura visual de que Frederico Pratas é conhecedor — nomeadamente a cinematográfica — oferece uma narrativa com princípio, meio e fim, mas também é passível da extracção de momentos, que é o que cada uma das telas que compõem Solve et Coagula propõe, fotogramas de uma longa-metragem onde se vislumbram diferentes etapas de uma composição maior, a vida, com a gradação que aprofunda com a visão artística. E também a própria pintura é referenciada, das formas humanas e a pele feminina e masculina, da grande ocular que amplia em detalhe aquilo que pareceria periférico, tudo cozinhado sob uma receita de tradição mas com toques pessoais, numa pintura que é pensada, pensativa e que serve também de ferramenta para a auto-análise, de um espírito. O que a audiência contempla é a pintura vista por um pintor singular e a história desse pintor explorada pela pintura.

A inquietação que suscita Solve et Coagula vem também do lado mais rugoso e imperfeito que assume orgulhosamente, um baralhar de cartas das valências técnicas de Frederico Pratas, e de voltar a distribuir numa nova ordem. Parte do seu processo criativo é essa constante criação e destruição de formas, à procura de novas hipóteses, caminhos por explorar, amparados pelas condições que se criam para a sua existência. Com a tela inacabada e uma atitude questionante, a renovação remete para um processo circular, aliado às referidas ambições do permanente, do eterno, da força bruta inexplicável.

As dimensões comedidas comportam a bestialidade das tintas, que é de uma fisicalidade insustentável pelos limites da tela, daí haver uma expansão para as margens e bordas, quase como se a pintura fosse esse excerto de um campo alargado da natureza, território da criação e a sua dissolução, Solve et Coagula: destruir e solidificar, respirar a pureza do ar para nascer outra vez no mesmo corpo, um ciclo contínuo para a espiral do tempo continuar a crescer, consciente da perda e do que desapareceu.

Frederico Pratas – fredericomagalhaespratas.pt

Miguel Meruje – miguelmeruje.com