Salvados

Do cimo da escada o que vi foi confuso. Havia uma contração do espaço. O eco era curto e cavo. Desci uns degraus. Uma superfície escura e baça movia-se lentamente. Era um chão alto em movimento. Toquei a superfície com a sola do tênis para começar a acreditar. Chapinhava. Objetos familiares foram surgindo com lentidão, flutuavam em profundo silêncio, como uma esquadra furtiva, navegando pela calada de uma noite tropical. Água, muita água. Escuro. Não acendas a luz. Quis um espaço alto e estrelado onde não estava. Chegaram imagens de brincadeiras no tanque das hortas. Barcos e marinheiros foram-se esfumando, transformando-se em papéis encharcados, inteiros e rasgados, telas inclinadas para o fundo, pincéis fazendo uma estranha coreografia, pastas inchadas e desventradas. As linhas e as caras afogadas oscilavam com leveza e vagar, como num charco de massacre. O sonolento torpor e visões de corpos retorcidos, rasgados e enlameados foi roto pelo raio azul da luz circular do auxílio que chegava. Acordei e era verdade.

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